Venha para o consumo
Com um poder de compra estimado em R$ 506 bilhões, os jovens entre 18 e 30 anos estão obrigando as empresas a rever suas estratégias.
Um dos momentos de lazer da paulistana Renata Bertolucci, 27 anos, é quando ela dirige seu HB20, estalando de novo, pelas ruas do bairro do Tatuapé, na zona leste de São Paulo, onde vive com a família. As prestações do veículo que ela divide com os pais são pagas com o resultado de seu trabalho. O salário ganho por Renata na função de auxiliar de escritório na sede do banco Safra, na avenida Paulista, um dos centros financeiros da capital, tem uma importância ainda maior para sua família. Além de ajudar nas compras de alimentos, é ela quem paga a mensalidade do serviço de internet banda larga instalado em casa.
Renata faz parte de um grupo de jovens na faixa etária entre 18 e 30 anos que está sob o escrutínio de agências de publicidade, fabricantes de produtos de consumo e prestadores de serviços. Afinal, trata-se de uma massa composta por 42,1 milhões de pessoas, com renda anual estimada em R$ 506,6 bilhões, de acordo com estudo do Data Popular, instituto paulistano especializado em pesquisas. A cesta de compras dessa turma vai muito além do telefone celular e do notebook. O estudo do Data Popular mostra que suas prioridades de compras para os próximos 12 meses recaem sobre itens como móveis, tevês e geladeiras (veja quadro ao final da reportagem).
Com uma renda maior que a de seus pais, mais escolaridade e domínio dos meios digitais, essa moçada sub 30 vem mexendo com as estratégias de marketing das empresas e com a criatividade das agências de publicidade. “Eles não são fiéis às marcas”, afirma Renato Meirelles, sócio-fundador do Data Popular. “Na hora de decidir o que comprar, esses jovens levam em conta componentes emocionais e racionais, mas, acima de tudo, querem ser ouvidos.” Para Meirelles, esses componentes são típicos de uma cultura do gosto-não gosto-troco, fomentada com a popularização das redes sociais. A operadora de telefonia TIM é uma das empresas que estão se esforçando para entender esse consumidor.
Para isso, incorporou ferramentas do mundo virtual à sua política de desenvolvimento de serviços. Um bom exemplo dessa preocupação é o TIM Beta, um plano dedicado ao público jovem que está sendo construído por meio de plataforma colaborativa, o crowdsourcing. Com isso, cada integrante da rede pode opinar sobre os itens que deveriam ser incluídos no pacote. A seleção dos clientes também segue uma lógica diferente. “Esse chip não está sendo comercializado e são os usuários do Beta que escolhem quem vai participar”, diz Roger Solé, diretor de marketing da TIM. “Quanto mais ativo for o perfil nas redes sociais, mais ele pontua, tendo acesso ao melhor que o plano pode oferecer.”
Outro exemplo de mudanças na estratégia de produtos e de comunicação pode ser visto na PepsiCo. Lá, o trabalho vem sendo feito com mais força na linha de salgadinhos Doritos, direcionada ao público entre 18 e 24 anos. Desde o começo do mês, o slogan “Para os Fortes” passou a ser grafado nas embalagens do produto. “Antes, o Doritos tinha como mote a sua divisão com os amigos”, afirma a vice-presidente de marketing da PepsiCo no Brasil, Patrícia Kastrup. “Agora, apostamos na afirmação da personalidade do consumidor.” O novo posicionamento foi uma decisão global. Mas é preciso cuidado. Afinal, apenas um slogan pode não ser o suficiente para fisgar esse consumidor.
“A marca tem de fazer parte da vida e da cultura do jovem, não apenas fingir que faz,” afirma Guga Ketzer, vice-presidente de criação da agência de publicidade Loducca. Qualidade também é fundamental. “Prefiro pagar um pouco mais caro e levar para casa um produto no qual confio”, diz o paulistano Willy Provedelli dos Santos, 27 anos, também morador da zona leste de São Paulo e graduado em psicologia. Opiniões como a de Santos têm sido cada vez mais decisivas na hora de as famílias adquirirem produtos de consumo. “Esses jovens estão influenciando nas compras mais importantes”, diz Samuel Matsuyama Rodegheri, diretor de produtos da paranaense Positivo Informática, líder do mercado nacional de computadores.
“São eles que fazem pesquisa de preço e checam os melhores modelos. Tudo pela internet”, afirma Meirelles, do Data Popular. Além de manejar essas ferramentas virtuais, esse contingente, especialmente o das classes C, D e E, tornou-se referência porque boa parte tem uma educação formal melhor que a dos parentes mais velhos. “Meus pais sempre pedem a minha opinião”, diz Ignes Barcelar dos Santos, de 27 anos. “Mesmo se não conheço determinado produto, eles sabem que tenho mais acesso à informação e vou pesquisar a respeito.” Formada em administração e logística, ela cursa pós-graduação em gestão de qualidade. Ignes é filha de uma cuidadora de idosos e de um metalúrgico e mora com os pais em Guarapiranga, bairro da zona sul de São Paulo.
A infidelidade desses consumidores em relação a marcas funciona como combustível para quem desembarcou há pouco tempo por aqui, como a montadora japonesa Nissan. “Com 12 anos de atuação no Brasil, podemos dizer que somos uma marca adolescente”, afirma Murilo Moreno, diretor de marketing da Nissan. “Os jovens têm mais liberdade para escolher uma marca nova do que os seus pais.” Isso tem dado resultados principalmente com o seu compacto March. Atualmente, 24% das vendas desse modelo são para motoristas entre 18 e 30 anos. Nesse contexto, não se pode atribuir a uma mera coincidência o fato de o primeiro carro da bancária Renata também exibir o logotipo da Hyundai, que começou a produzir localmente há menos de seis anos. Por Luciele VELLUTO e Carlos Eduardo VALIM. Fonte Revista Isto É Dinheiro.